domingo, 6 de fevereiro de 2011

Marcela.1

Tempos antes de chegar ao Rio de Janeiro Marcela decidira ter uma rede na sala. E nenhuma cadeira.
– A gente sentava no chão naquela época. – contaria décadas mais tarde a um filho bochechudo já dando sinais de cansaço mesmo sentado há horas na cadeira de sua escrivaninha. - Eu era filha de hippies. – completava ao filho. Ao filho lhe soava exótica e imprecisa essa palavra como talvez stalinismo. Muito pouca gente no mundo a gente chama de stalinista ou de hippie. E no entanto existem.
– Não gosto de redes. – observara Davi décadas antes logo depois do sexo. O décadas antes não fazia tanta diferença quanto o logo depois do sexo. – Transar na rede lembra aquelas novelas do senhor de engenho com a escrava na varanda ou dos índios.
– Os índios sempre usaram redes. Até onde sei.
Marcela não pensara em nada senão índios ao se ver dois longos meses envolvida num projeto publicitário todo arranjado numa aldeia indígena para a qual jamais ela teria de se deslocar.
– Ótimo – dissera Davi – assim a gente não precisa se separar por dois meses longos.
Mas era mentira pois Davi no fundo decidira acabar tudo com Marcela desde aquele exato minuto ou mesmo desde um pouco antes. Mas disso nem ele sabia com clareza porque afinal não fazia nem dez minutos seu corpo nu se desgrudara do corpo nu de Marcela e naquele calor todo com a luz tão baixa ficava difícil demais de raciocinar.
– Eu gosto de você e por isso não quero passar dois meses separado de você para você perder dois meses da tua vida dormindo numa rede no meio duma aldeia indígena no meio da Amazônia.
Marcela não sabia se gostava demais ou não de Davi e por isso não perdia tempo afirmando esse tipo de coisa.
– Eles iriam me botar num hotel provavelmente. Mas eu gostaria de dormir numa rede.